A gruta é mais extensa do que a gruta

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    sábado, março 28, 2009

    Na eterna vontade de mudar este sítio, sempre brigando com a falta de tempo aliada a coisas melhores a fazer, volto a tentar publicar textos mais curtos e frequentes. O porrilhão de filmes a comentar vai ser dividido nas entradas seguintes; enquanto isso, seguem algumas coisas que precisavam ser registradas.

    ***

    Francis veio falar comigo pelo MSN para fazer comentários iniciais e bem breves sobre "A Volta do Regresso" (que ele viu em DVD, ou seja, sem a fotografia finalizada, com correções de cor), que por puro azar não teve suas sessões frequentadas por críticos. Ainda esperamos poder falar mais a respeito ao vivo, mas as poucas palavras que trocamos ajuda a confirmar algumas coisas que eu já pensava e também ressalta uma referência que faz parte do filme mas que não o define completamente, acredito (assim como nenhuma outra mais específica parece resumi-lo). Como esse tipo de troca é muito importante para mim, peço licença para relatar aqui um pouco da conversa.

    Não me surpreendeu nem um pouco quando ele disse que só gostou do filme (com naturais ressalvas) ao vê-lo pela terceira vez (da primeira, não gostou; da segunda, teve dúvidas). Também o considero especialmente desagradável à primeira vista, quando os problemas de produção evidenciam demais o amadorismo da equipe e atrapalham a fruição da obra. É uma pena que júris em geral só vejam os filmes uma vez, o que me faz desconfiar de todas as premiações, especialmente as de filmes não lançados comercialmente. Vejo demais a "forma" ganhando do "conteúdo" (como se ambos não fosse entrelaçados a ponto de serem inseparáveis), ou seja, ganha o mais "bem feito" e não o "melhor"... É como diz o Inácio Araújo, fã do filme do Vebis: filmes não precisam ser bem feitos, precisam de boas ideias. E estas, acho que não faltam em "A Volta do Regresso" (aliás, o filme me parece saturado delas; talvez o caminho seja tentar fazer filmes mais simples).

    Gostei bastante quando ele disse achar interessante a "plasticidade esquisita" do filme. "Hoje, isso me parece ir a favor do filme, talvez mais do que o que eu havia imaginado quando li (o roteiro)", escreveu. Isso foi cuidadosamente pensado e acho que o filme transmite o que eu desejei, mas a impossibilidade de trabalhar melhor os enquadramentos e a falta de rigor nos movimentos de câmera (por causa de uma série de problemas que não merecem citação) é o que mais me incomoda quando o revejo. Mesmo assim, disse o Francis: "Aqueles ambientes, que soam reais, mas improvisados, plastificados e decadentes são mais fortes". Ele também diz que minhas escolhas de locações e de composições "foram um acerto" ao renegar um naturalismo "de rua" para gerar esta camada adicional de ironia: a de fazer um filme que fala insistentemente sobre o Brasil sem mostrá-lo _na própria sinopse, defino o espaço do filme como "um Brasil sem céu"; todo o tempo, quis trabalhar com "não lugares" e passei esta orientação ao diretor de arte.

    Já comentei por aqui que muita gente achava, por eu ter escalado o Carlo Mossy, que o filme se tratava de uma "homenagem à pornochanchada", o que não é nem nunca foi. Eis o que me disse o Francis: "O seu filme está mais para chanchada do que para pornochanchada: um filme de interiores, de estúdio que tem como princípio uma obra dentro da obra. Só que é um filme de hoje, inclusive porque espetáculo é mais memória que um fato (as chanchadas trabalhavam isso como fato). (...) Esse lado irônico, bufão e precário é mais da chanchada do que da pornochanchada". Também sempre sustentei que o filme não era nem um pouco nostálgico, e felizmente isso ficou bem claro para ele: "O resultado é um diálogo (com a chanchada), sem saudosismo, porque ele é bem resolvido como filme do século XXI". Ele ainda diz que o filme "lembra vagamente Watson Macedo", ao que respondi que esse espírito da chanchada me parece mais concentrado no filme dentro do filme, que é simplesmente "Rei Lear" ambientado no Carnaval (!), ou seja, um choque cultural que vemos nas chanchadas mais abertamente paródicas, como "Nem Sansão Nem Dalila" ou "Matar ou Correr".

    ***

    Há alguns dias, um amigo de infância, também jornalista, me ligou pedindo entrevista sobre "A Volta do Regresso" para uma matéria de capa e página 3 no caderno de variedades de domingo do diário para o qual trabalha. Não gosto muito de dar entrevistas (mas já dei muitas, sobre assuntos diversos, inclusive sobre este site), e esta foi a pior de todas, porque não tive mais do que dez minutos para as respostas. Até aí, uma pena, mas normal. Pelo menos as fotos ficaram bonitas, embora o enfoque da matéria tenha repetido essa história de ligá-lo somente à pornochanchada (parece que não vai ser fácil ele se livrar desta análise apressada). O problema é que o repórter (não por má-fé, disso tenho certeza) publicou algumas informações falsas, retiradas não imagino de onde (e um texto meu _muito ruim, por sinal_ retirado de um outro site também foi publicado sem minha autorização...). Ou seja, o excesso de imaginação (ou falha de memória) aliado à falta de checagem resultou na publicação de mentiras que podem me prejudicar, caso alguém que não me conheça pense que eu menti para o repórter... A pior de todas foi dizer que eu sou coautor (é, agora se escreve sem hífen), com o André Barcinski, do livro "Maldito", a biografia do Mojica (de quem eu fui ao aniversário de 73 anos, em plena sexta-feira 13 de março, num inferninho da Augusta, com direito a bolo em forma de cartola, a convite da Alê _mas essa história é para mesa de bar), enquanto todo mundo sabe (ou deveria saber) que o livro é do André e do Ivan Finotti (e eu conheci ambos quando trabalhei na Folha...). Então fica publicado aqui o meu desmentido.

    ***

    O até então ótimo Last.fm fez uma grande presepada: resolveu começar a cobrar, a partir de abril, pelas suas rádios _que respondem por 90% da graça do site. Tudo bem que o ano é de crise (que afeta as empresas anunciantes), o serviço é honesto e não é barato, mas querer voltar ao modo de negócios do século XX quando existem serviços análogos gratuitos me parece suicídio comercial. E é falta de visão pensar que manter a gratuidade em três países (EUA, Reino Unido e Alemanha) não irá afetá-los; o site é uma comunidade mundial, as pessoas têm amigos em tudo quanto é país, a imensa maioria que não é trouxa não vai pagar (e quem em sã consciência começaria a pagar por um serviço que está degringolando?), e o resultado é que o conteúdo (construído pelos clientes que agora eles querem isolar) vai empobrecer imensamente. É uma pena _e o pior é que acredito que isto poderia ser evitado. Faltou ousadia e tino comercial para esse pessoal.

    E minha rádio até que estava boa, com mais de mil artistas diferentes em dois anos. Fui escutar ontem para me despedir, e tocou Beastie Boys, The Dave Brubeck Quartet, Fantômas, Roy Orbison, Gorillaz, Robert Gordon with Link Wray, Roberta Flack, Elvis Presley, Talking Heads, Robert Plant & Alison Krauss, The Slits, The Kinks, The Clash, Haydn, Andrew Lloyd Weber, Syd Barrett, Pearl Jam, Queens of the Stone Age, Gal Costa, Vivaldi, Young Marble Giants, MGMT, Beethoven e Stooges. Nesta ordem. E agora não vai ter mais (pelo menos até todo mundo migrar para outro site parecido, se a economia mundial deixar _de qualquer forma, a internet não parece mesmo ser um lugar para permanências... embora este site vá fazer 7 anos dentro de alguns dias).

    No texto que vem: aniversário de 7 anos ("Emoções Sexuais de um Jegue" e outros filmes fica para o próximo, por causa da efeméride).

    12 comentários:

    Alê Marucci disse...

    Tem link para a matéria sobre "A Volta do Regresso"?

    Marcelo V. disse...

    Espero que não!

    Marcelo V. disse...

    Morreu o Ankito, e acabei de editar a notícia que sai no jornal de amanhã. O curioso é que estamos dando uma foto de "É de Chuá" (1958, de Victor Lima) na qual ele e Grande Otelo são erguidos pelos colarinhos por o que parece ser um mordomo; não lembro se já publiquei aqui uma foto de "A Dolorosa", um vídeo que fiz em 2004, no qual os atores (entre eles o Cássio Inácio, que atualmente está fazendo campanha publicitária da Tim) estão em situação idêntica...

    Ailton Monteiro disse...

    Espero que um dia possa ver o teu filme e também fazer uma entrevista com você para publicar no blog, Marcelo. Vc deve ter muitas histórias legais para contar.

    Marcelo V. disse...

    Muitas histórias tristes também, hehehe.

    Ailton Monteiro disse...

    As histórias tristes também são interessantes. hehehe

    Marcelo V. disse...

    No próximo texto, semana que vem, aniversário de 7 anos do site com retrospectiva dos melhores filmes vistos em 2008/2009.

    Anônimo disse...
    Este comentário foi removido por um administrador do blog.
    Marcelo V. disse...

    O comentário que apaguei era um daqueles spams em japonês (nunca apago ou modero comentários, mas para que eu ia deixar um monte de palavras sem sentido em japonês por aqui?).

    Vebis Jr disse...

    Vale lembrar que esta de " lembrabnça saudosista da pornochanchada" foi uma presepada vinda da minha boca em pelo menos duas vezes que comentei dele distraído.

    Sorry Marcelo....faço aqui o mea culpa.

    Das musicas que tu ouviu, robert Gordon com o Link é genial....Tarantino adora usar!

    Acabei de te seguir no blog.

    abraco

    Marcelo V. disse...

    Ouvi onde, no Last.fm? Os putos começaram a cobrar pela rádio! É sempre assim... Nesse caso é sacanagem porque quem construiu aquilo foram os usuários.

    Marcelo V. disse...

    Mas você não é o único a ter dito ou pensado isso _inclusive gente da própria equipe me veio com essa, o que é inacreditável, mas aconteceu...

    Na platéia