A gruta é mais extensa do que a gruta

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    quarta-feira, março 01, 2006

    Filmes vistos entre 16/02 e 28/02

    Acabou o Carnaval?

    Justiça: O filme acompanha algumas audiências com juízes e advogados no Rio de Janeiro, mostrando seu o cotidiano e o dos réus e suas famílias, delineando com clareza o fosso sociocultural que os separa. É bem caprichado no tratamento da imagem (a câmera sempre é fixa _do jeito que eu gosto de filmar, por sinal), o que me incomodou um pouco: tudo parece tão pouco espontâneo, boa parte das situações parecem armadas... Senti algo parecido ao ver o "Titicut Follies", do Wiseman, anos atrás.

    Match Point: O trailer vende um peixe, mas o que vemos é algo mais interessante. Allen volta a Dostoievski, desta vez a sério, e entrega um filme atípico (embora com a sua cara) e invulgar. Mesmo assim, eu ainda acho que poderia ser bem melhor. Ainda não vi "Crimes e Pecados"...

    O Homem Que Copiava: A revisão do segundo longa de Jorge Furtado me fez encará-lo com mais simpatia (as personagens de Piovani e Cardoso são ótimas), justamente porque o filme me pareceu mais simples e menos pretensioso. Mas eu ainda prefiro "Houve uma Vez Dois Verões", filme bem mais esperto.

    The Laundry: O título brasileiro é "O Gordo e o Magro na Lavanderia", o que é um baita de um estelionato, porque Oliver Hardy não aparece no filme, e Stan Laurel não interpreta o Magro como viríamos a conhecê-lo. Curta de 1923, pertencente à célebre série "Comedy Capers", traz Laurel imitando Chaplin descaradamente, numa performance não muito brilhante _a graça mesmo está nas situações, ingênuas mas muito eficientes. Uma delícia de ver.

    Bendito Fruto: Filme extremamente despretensioso, nem parece brasileiro (engraçado que diziam isso de "Cidade de Deus"). Tudo parece construído para soar meio falso e folhetinesco (estou superestimando o filme?). Em geral, o elenco está bem, mas o destaque fica para Zezeh Barbosa, Otávio Augusto e Lúcia Alves.

    Såsom i en spegel: No Brasil, "Através de um Espelho", que inaugura a tal da Trilogia do Silêncio, recém-lançada por aqui pela Versátil naquelas edições meio picaretas de sempre. Diferentemente de "O Silêncio", este é um Bergman bastante típico, trazendo conhecidas obsessões do diretor, como a inevitabilidade da morte e o questionamento da existência de Deus, além de dois de seus atores mais marcantes, Gunnar Björnstrand e Max von Sydow. Mas não é um dos meus preferidos do diretor.

    Kanal: O filme não ganhou título em português (a tradução literal seria "Esgoto"), mas foi lançado aqui pela Aurora, numa edição melhor do que a média (os extras são saborosos). Mas o melhor mesmo é o filme, o segundo dirigido por Wajda, um mestre do movimento de câmera. Obra corajosa não só pelo arrojo com que filma seqüências de batalha (em uma delas, foi usada munição de verdade, porque o festim não fornecia a luminosidade necessária!), mas por abordar um assunto tão delicado quanto o levante de Varsóvia, num período crucial da história da Polônia, coincidente com a transição de poder na União Soviética, graças à morte de Stálin. Filmaço!

    Mon Oncle: É impressionante como Jacques Tati nos transporta para um mundo totalmente particular _nunca vi nada parecido com seus filmes (apenas "As Bicicletas de Belleville", que tenta emular o mestre, mas não chegam nem perto). Cada detalhe é tão bem pensado... E aqui ganha-se muito com o uso da cor, valorizando figurinos e cenários. Também se destaca o design dos móveis na casa mecanizada e barulhenta (ah, a modernidade de outrora). Os cachorros estão ótimos.

    Breakfast at Tiffany's: Faziam uns quinze anos que eu queria assistir a este filme. Graças a uma mostra gratuita dedicada a Truman Capote, consegui (em termos, exibiram o DVD). Mas é claro que valeu a pena ouvir "Moon River" e ver a gata-sem-nome Holly Golightly naquela clássica seqüência dos créditos iniciais. Infelizmente, o filme não termina tão bem quanto começa (genial). Mickey Rooney está absolutamente fantástico como japonês. E dá uma dor no coração quando Audrey acende o primeiro cigarro... Nunca vou entender porque as mulheres que fumam se depilam, não faz o menor sentido.

    O Corpo Ardente: Filme bonito e difícil, de olhares e silêncio, de música e movimento, de avanço e recuo no tempo. Que fantástica está a Barbara Laage! Ninguém no Brasil filmou mulheres (e cavalos) como Khouri, orgulho do nosso cinema.

    Oodishon: Sempre me passaram a impressão de que esta obra do prolífico Takashi Miike ("Audition" é o "título internacional", ou seja, em inglês), de quem ainda não tinha visto nada, era um filme de terror bem sanguinolento, "gore", limitado apenas aos fãs do gênero, entre os quais não me incluo _e não é nada disso. Na verdade, é extremamente (o advérbio vai bem aqui) romântico, bonito e com suas naturais doses de aflição. Claro que existe um susto ou outro bem colocado, mas o filme está milhas acima das amostras desse "novo terror japonês" (se é que o rótulo faz algum sentido) que tenho visto. Lembra David Lynch...

    O Invasor: Filme extremamente fluente e gostoso de assistir, cujo destaque absoluto é a impressionante atuação do Paulo Miklos _como é importante, no cinema, se aliar às pessoas certas (Sabotage, Marçal Aquino e cia., o que seria do filme sem eles?). Contrasta bastante com o mais recente do diretor, que é bem mais irregular, mas também mais profundo e com momentos mais brilhantes.

    Bossa Nova: Comédia (de erros) romântica bastante agradável, que, apesar do roteiro sem muitas ousadias e dos planos turísticos do Rio que lembram novelas da Globo, traz um elenco afiado e uma porção de cenas boas, como as da aula de palavrões em inglês, a da balsa com os walkmen e a dos homens ouvindo os tecidos. Fagundes faz muito bem o papel de galã, e Pedro Cardoso surpreende como herói romântico. Feito claramente para o "público internacional", o que o deixa muito preso a uma série de convenções.

    Charlie's Angels: Full Throttle: O diretor McG, mauricinho de Los Angeles, veio da publicidade e da MTV, mas diz que suas influências são Nicholas Ray, David Lean e Alfred Hitchcock (arrã). O que poderia ser uma bomba, na verdade tem seu valor principalmente porque não se levar a sério em momento algum, mesmo os clichês mais batidos aparentam estar lá por ironia, e não incompetência. O clima de besteirol generalizado dá um tremendo frescor às atuações (Cameron Diaz, em especial, dá um show ao subverter sua imagem glamourosa, em cenas como a que analisa cocô de pombo e dança MC Hammer). Curioso, o menos engraçado em cena é justamente o John Cleese, do Monty Python...

    MIIB - Men in Black II: Seqüência bem mais chata do que o original (80 minutos que demoram para passar), que já não era nada especial. Bom elenco subaproveitado (com exceção da Lara Flynn Boyle, de lingerie o tempo todo) num enredo pífio. Não vejo muita graça no Sonnenfeld.

    Nattvardsgästerna: Em português, "Luz de Inverno", o que faltava para eu completar a trilogia do silêncio de Ingmar Bergman. É o que menos me impressionou entre os três, o que é estranho, já que obras que abordam o catolicismo geralmente exercem impacto sobre mim. Talvez por eu tê-lo visto em pleno sábado de Carnaval, estava em outro clima...

    Capote: À primeira vista, o maior diferencial deste filme é um certo pudor em mitificar excessivamente a personagem principal _embora isso aconteça quando frases como "a forma como as pessoas escrevem mudará após este seu livro". Aqui, Truman Capote é mostrado como hipócrita e fraco, em interpretação pouco espetacular (e isso não é necessariamente crítica) de Philip Seymour Hoffman. Achei que fosse gostar bem mais...

    Suchîmubôi: Tentei ver este "Steamboy", de Katsuhiro Otomo, na Mostra de 2004, mas a sessão, num domingo à noite, esgotou umas 12 horas antes. O trabalho de animação (computadorizado, mas buscando parecer pintura) é naturalmente impressionante, mas o enredo deixa a desejar, apesar de sua relativa originalidade. Engraçado como estamos acostumados a ver gente de tudo quanto é nacionalidade falando inglês nos filmes americanos e ingleses, mas estranhamos quando uma história totalmente passada na Grã-Bretanha é falada em japonês...

    Playtime: Algumas gags visuais geniais estão entre os melhores momentos deste filme de Jacques Tati (também um mestre no uso do som e da cor), um fantástico "orquestrador" de planos. Bastante datado e peculiar, é um filme difícil, impressionante. Pena que a edição em DVD, apesar de não ser em tela cheia, não respeite a janela original do filme, feito em 70mm.

    O melhor: "Kanal"; o pior: "MIIB - Men in Black II".

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