A gruta é mais extensa do que a gruta

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    quinta-feira, novembro 13, 2008

    Como havia avisado nos comentários do texto abaixo, "Nas Duas Almas" passou no Festival de Curtas do Rio. Segundo me diz o Vebis, gerou bastante discussão e elogios, o que me deixa muito feliz. Não sei se alguém mais escreveu sobre o filme, mas sempre fica essa vontade de discutir a obra, repensá-la, colocá-la em crise; o problema é que este estimulante diálogo é raríssimo... No caso de "A Volta do Regresso", um filme que dá muito pano para a manga, esse diálogo tem sido quase inexistente por puro azar: nos festivais mais importantes em que o filme entrou, não houve cobertura jornalística, e nos que houve e o filme era garantia de passar, eu não o inscrevi por motivos vários. Assim que eu tiver um tempo, vou colocar o DVD do filme para download no KaraGarga e quem quiser assistir e dar sua opinião finalmente terá a oportunidade.

    ***

    Diferentemente do habitual, vi vários filmes recentes nos últimos dias (mas não o novo 007, sobre o qual Luis Fernando Verissimo escreveu: "Tiveram o bom senso de manter o título do original, 'Quantum of Solace', no Brasil. Ninguém sabe o que quer dizer, mas é a melhor coisa do filme".). O melhor foi o divertidíssimo "Planet Terror", o ponto alto de Rodríguez. Diante desta homenagem aos filmes que cresci vendo nos anos 80, pergunto: qual será a memória afetiva das próximas gerações, as megaproduções em série como "O Senhor dos Anéis" e "Harry Potter"? Mas o filme é de grande ironia: o roteiro, bem escrito (mas com cenas descartáveis, como todas as com a personagem de Tarantino), tem ótimos diálogos e aproveita bem todos aqueles clichês _mesmo a "queima" da película e a falta de um rolo que encobre um grande segredo de um dos protagonistas funcionam muito bem. E ainda traz dois pitéus, Rose McGowan e a Fergie. A outra beleza recente é "Ratatouille", que, se não é o melhor de Brad Bird nem da Pixar (pelo menos "Toy Story" e "Finding Nemo" me agradaram mais, assim como o "The Iron Giant"), não deixa de ser excelente. Sempre tive muito interesse (inversamente ao meu conhecimento) pela gastronomia e lamento que os filmes sobre o assunto não tenham cheiro... E fiquei o tempo inteiro sabendo que eu conhecia o ator que fazia a voz do melhor personagem, o crítico Anton Ego, mas não conseguia nomear aquela voz _depois vi que é de Peter O'Toole, claro. É ele que diz as melhores palavras do roteiro, antológicas, que é preciso reproduzir: "In many ways, the work of a critic is easy. We risk very little yet enjoy a position over those who offer up their work and their selves to our judgment. We thrive on negative criticism, which is fun to write and to read. But the bitter truth we critics must face, is that in the grand scheme of things, the average piece of junk is more meaningful than our criticism designating it so. But there are times when a critic truly risks something, and that is in the discovery and defense of the new. The world is often unkind to new talent, new creations, the new needs friends. Last night, I experienced something new, an extraordinary meal from a singularly unexpected source. To say that both the meal and its maker have challenged my preconceptions about fine cooking is a gross understatement. They have rocked me to my core. In the past, I have made no secret of my disdain for Chef Gusteau's famous motto: 'anyone can cook'. But I realize, only now do I truly understand what he meant. Not everyone can become a great artist, but a great artist can come from anywhere."

    É bastante curioso que "American Ganster", de Ridley Scott (visto na versão não-censurada, de quase três horas _20 minutos a mais do que a que foi para os cinemas), não alcance, em nenhum momento, o status de "épico", como "O Poderoso Chefão" ou o "Scarface" de De Palma, para citar duas referências óbvias. Parece muito mais um simples filme policial, como "Operação França", mas sem ser inesquecível como este ou loucamente divertido como um blaxpoitation como "Coffy". Mesmo Denzel Washington e Russell Crowe, ambos muito bons, não são tão marcantes como Pacino e De Niro em "Fogo contra Fogo", por exemplo. Enfim, é um filme que tinha tudo para ser grande e inesquecível, mas que não passa de agradáveis três horas que voam _o que também não é exatamente pouco. O que será que ficou faltando? Muita coisa falta num dos piores filmes que vi nos últimos tempos, o muito falado "Little Miss Sunshine". Jonathan Dayton e Valerie Faris (que, eu não sabia, já são cinquentões) dirigiram uma série de clipes legais (de bandas como Red Hot Chili Peppers, REM e Smashing Pumpkins) mas naufragaram fragorosamente ao chegarem ao longa-metragem. Este deprimente e mal escrito filme é um lamentável e previsível amontoado de clichês e uma enorme perda de tempo _tem apenas duas cenas boas, uma com Abigail Breslin (que estreou em "Sinais", do Shyamalan) e Alan Arkin, que passa alguma emoção, e a apresentação da menina no concurso de misses, a única que me arrancou uma risada. É incrível que um elenco tão fantástico (onde Breslin acaba se sobressaindo, vejam só) tenha embarcado numa roubada dessas _o final é revoltante e inacreditável de tão péssimo. Se querem ver um filme de família disfuncional com personagens caricatos, fujam deste aqui e vão ver qualquer um do Wes Anderson.

    A série da vez foi a primeira temporada de "Mad Men", uma das mais comentadas do ano passado. A reconstituição de época é impressionante (assim como a de "American Gangster") e todo o resto é muito bem feito, mas a série também "decola"; seu grande prestígio, infelizmente, parece ser fruto do baixo nível da maioria da concorrência... ou estou errado, já que também estou longe de acompanhar tudo o que anda passando? O grande destaque e a grande revelação é Christina Hendricks, extremamente sexy como Joan Holloway, personagem secundária, mas que dá o tempero à série: suas cenas são sempre luminosas. É o que me fará ver a segunda temporada, já completa.

    ***

    E voltemos à época em que se passa "Mad Men", o comecinho dos anos 1960, que tem sido dominado por Itália, França e Japão (superioridade numérica do antigo Eixo, hmm). Voltei a encontrar um autor muito polêmico e irregular, mas do qual eu gosto muito (talvez também por ser polêmico e irregular?), Pier Paolo Pasolini. Vi, separado dos outros episódios que compõem "Ro.Go.Pa.G.", "La Ricotta", tido por alguns como seu melhor trabalho. Não concordo (fico com a obra-prima "O Evangelho Segundo S. Mateus", seguida de "Teorema", que certamente têm muito em comum com este média). Inspirado na paixão de Cristo (que o diretor diz considerar a mais bela história), traz planos coloridos que são verdadeiras pinturas, além do empolgante twist de Carlo Rustichelli e de Orson Welles, discreto (sente-se a falta de sua voz, já que ele foi dublado em italiano _apesar de a leitura labial indicar que ele disse o texto italiano). Na entrevista dada por seu personagem ele critica os italianos, elogia o marxismo e diz que Fellini "dança", enquanto lê "Mamma Roma" (ao fundo, toca uma versão do twist tema de "O Eclipse", de Antonioni). Apesar do tema, o filme é despretensioso, leve e bem-humorado. E vi também "Mamma Roma", seu segundo filme, que já traz várias das características vistas em suas obras futuras, como os planos frontais durante diálogos mais ou menos a la Ozu, muitos atores amadores (como as duas moças que namoram o filho da protagonista Anna Magnani _esta, em um de seus últimos filmes_, Silvana Corsini e Luisa Loiano) e um final extremamente poderoso e impactante, muitas notas acima do resto do filme. É bem mais cru que "Noites de Cabíria" _e é difícil dizer qual dos dois é melhor, embora eu costume balançar mais para o lado de Pasolini.

    Ainda na Itália, outra beleza é "La Frusta e Il Corpo", um dos filmes que Mario Bava assinou como John M. Old. É mais uma prova do extremo talento dele como diretor de fotografia: só mesmo um pintor para criar uma concepção não-naturalista em cores integrada à narrativa, sem parecer que está meramente se exibindo (isso vale também para a movimentação de câmera). A história, simplíssima, é contada lenta (mesmo o filme sendo curto) e silenciosamente (apesar da belíssima trilha sonora _de quem? Do grande Carlo Rustichelli, sob o pseudônimo de Jim Murphy). Christopher Lee (quando ainda era galã) e a bela e vampiresca Daliah Lavi estão ótimos. E vendo "I Fidanzati", fico mais convencido de que Ermanno Olmi é um injustiçado: por que ele não é tão comentado quanto Antonioni ou Scola (para citar dois italianos que não figuram entre os meus preferidos)? Este é mais um exemplo de que seu cinema é (ou foi, ainda não conheço sua obra mais recente) sofisticado e moderno. Já segue uma tendência bastante apreciada atualmente, a do fiapo de história sustentada por um distanciamento das personagens e pouquíssimos diálogos _particularmente, este estilo não me deixa me aproximar muito do filme, o que considero um defeito; muitos consideram uma qualidade, e é bom que seja assim. Então há profusão de elipses e flashbacks entremeados de retratos do ambiente e de seus habitantes. Mas abundam momentos belíssimos _a trilha sonora de Gianni Ferrio ajuda, assim como o carisma do casal protagonista, Carlo Cabrini (em seu primeiro e penúltimo filme) e Anna Canzi (também estreante de carreira curta).

    Já citei o danado do Antonioni duas vezes neste texto e vou ter de voltar a ele: juro de pés e mãos juntas que tenho a maior boa vontade do mundo com o diretor, mas ele não colabora. Vendo "Deserto Vermelho", sou imediatamente conquistado pela bela seqüência dos créditos iniciais, com imagens desfocadas e música eletrônica, além dos nomes de Monica Vitti e Richard Harris; o problema é que o filme não demorou muito para me perder _e perdeu mesmo, porque ocorreu algo raríssimo: caí no sono antes de sua metade (e era bem cedo, horas antes do meu horário normal de sono). No dia seguinte, voltei à carga e tentei desesperadamente me ligar ao sofrimento da personagem de Vitti e à beleza da fotografia... em vão (pelo menos consegui ficar acordado, embora também tenha tido um pesado ataque de sono). Detesto dizer que algo é "chato" porque a palavra, do jeito que é comumente empregada, indica que o problema é do espectador e não da obra; mas ela se aplica perfeitamente a "Deserto Vermelho" porque o filme é "flat", sem altos nem baixos, como a linha que indica que o coração de uma pessoa já não bate. Eu tentei, Antonioni, mas você me decepcionou de novo. Em sua homenagem, um spoiler: após anos longe dos quadrinhos, vai aí a primeira tirinha que fiz com o Stripgenerator, que é limitadíssimo, mas quebra o galho (eu prefiro desenhar, mas atualmente não tenho material adequado):

    Il Deserto Rosso

    Na França, o destaque é Jean-Luc Godard, com três filmes: "Les Carabiniers", "Bande à Part" e "Une Femme Mariée: Suite de Fragments d'Un Film Tourné en 1964". O primeiro é bastante irônico, divertido e até didático e despretensioso. O músico Patrice Moullet, que como ator assinava Albert Juross, está hilário, e Geneviève Galéa chama a atenção pela grande beleza (o que não é de surpreender, sabendo-se que é a mãe de Emmanuelle Béart). "Bande à Part", uma adaptação literária, é talvez seu filme mais bem-humorado (além das famosas cenas do Louvre e a da dança, temos uma narração bastante irônica do diretor, muitas brincadeiras com montagem, som e decupagem e claras declarações de amor ao cinema americano mais popular) e, dos que vi, o que mais se assemelha a "Acossado". É também o filme em que Anna Karina aparece menos glamourizada: está menos bonita, mas mais jovial. E há a bela música de Michel Legrand. "Une Femme Mariée", meu preferido entre os três, soa bastante moderno na forma e na temática feminista. Macha Méril, belíssima, é a jovem casada que encontra o amante, questiona-se sobre as diferenças entre amor e sexo, vê-se no meio de uma conjuntura que, fazendo das mulheres o alvo primordial do consumismo, as obriga a se adaptar a uma série de padrões um tanto esdrúxulos (o que não mudou até hoje). Suponho que Godard já estivesse brigado com Truffaut, pois há algumas claras citações a "La Peau Douce" (uma revista com uma reportagem sobre o filme é mostrada, assim como há uma espécie de reprise de uma homenagem a Jean Cocteau), um filme já tão longe de qualquer cinema supostamente "de vanguarda" que aparenta ter pouquíssima ou nenhuma relação com o que foi chamado de Nouvelle Vague. Jean Desailly, morto em julho passado, carrega o filme. Dois detalhes me chamaram a atenção: o apartamento do diretor é usado como locação, e aqui aparece o plano em que Françoise Dorléac coloca a bandeja de café da manhã na soleira do porta e vem um gato cheirar os recipientes _o making of dele nós vemos em "A Noite Americana", quase dez anos depois. Completam este parágrafo que não toma banho mas usa perfume "Muriel ou Le Temps d'un Retour", de Alain Resnais (com uma montagem elíptica e frenética a ponto de me fazer lembrar de, oh, Russ Meyer), e "Le Feu Follet" ("O Fogo Fátuo" seria um título mais bonito e mais chamativo do que "30 Anos Esta Noite"), mais um exemplo do ecletismo de Louis Malle (o que me faz perguntar se este diretor tem um estilo).

    Na terra do sashimi de salmão, meu preferido foi "Nikutai no Mon", chamado por aqui de "Portal da Carne", que pode até ser visto como um precursor dos exploitation dos anos 70, por causa das cenas de tortura de mulheres nuas, mas é muito mais um filme político: passado no imediato pós-Guerra, com o Japão humilhado e ocupado por soldados americanos e protagonizado por mulheres que tiveram suas famílias destruídas e foram obrigadas a trabalhar como prostitutas, inicia e acaba com a imagem da bandeira dos EUA, sob palavras longe de gentis. Outro ponto interessante é o de que, apesar de um drama sociopolítico, o filme foge do naturalismo: não só tem aquela "cara de estúdio" (que está longe de ser uma coisa necessariamente ruim) como estiliza bastante as personagens por meio do figurino (cada prostituta tem sua cor e só se veste com ela durante todo o filme _o que facilita a identificá-las, por sinal). É também o filme de estréia de Yumiko Nogawa, na ativa até hoje (assim como o diretor, Seijun Suzuki). Em "Akai Satsui" (aqui, "Segredo de uma Esposa"), até onde me lembro o primeiro longa de Shohei Imamura que vejo, o drama familiar abandona a doçura de um Ozu para incluir violência e sexo, pratos típicos do erotismo japonês. Mas o filme está longe de ser um "exploitation" ou algo do tipo: é muito sério, complexo e bonito _mas também um tanto extenuante. No fundo, também soa como um filme feminista. E "Yukinojo Henge", de Kon Ichikawa, é bem menos impressionante que "Fogo na Planície". Mesmo assim, é bastante incomum: a encenação também foge do naturalismo (assim como os atores, cujas falas traduzem a história para o espectador sem sutileza), o enredo é exposto aos trancos e barrancos (as rupturas de tempo entre as cenas são grandes), e a fotografia é exuberante (lembra o "Gate of Hell" do Kinugasa, que dirigiu a versão original deste aqui em 1935 _o curioso é que Ichikawa usa o mesmo ator, o excelente Kazuo Hasegawa, que também estrela o "Gate of Hell" e que aqui interpreta dois personagens; este é seu penúltimo filme). Ayako Wakao está linda, e o Eiji Funakoshi de "Fogo..." também tem papel de destaque. É uma obra que se destaca mais por alguns momentos muito fortes do que pelo seu conjunto, que chega a ser dispersivo.

    Ainda na Europa, a Polônia trouxe "Nóz w Wodzie". É "A Faca na Água", primeiro longa de Polanski, escrito em parceria com Jerzy Skolimowski. Sem contar uma história complexa, arranha o comportamento de dois homens face a uma bela jovem (Jolanta Umecka, em seu primeiro filme, cuja carreira não se estendeu muito), mas introduzindo situações-limite. O diretor faria filmes bem mais empolgantes (embora por vezes entregasse bombas como "Fearless Vampire Killers". Melhor é o soviético "Tini Zabutykh Predkiv", que em inglês ganhou o título de "Shadows of Our Forgotten Ancestors". O clássico de Sergei Parajanov experimenta com cores, lentes, efeitos visuais, posições de câmera, velocidades, que contam uma deprimente história nos cafundós dos Cárpatos. É um cinema brincalhão, de celebração, mais divertido de fazer (a não ser por aquela neve toda) do que de ver. E no país de Hussein Obama, o Clinton "bronzeado" (segundo o "caimano"), fui do conjunto formado pelas cinco partes de "Dog Star Man": estava mesmo com vontade de ver um filme não-narrativo, e esta série de Stan Brakhage veio bem a calhar. É bom ser desafiado de vez em quando, embora o impacto não seja dos maiores.

    ***

    Uma das minhas muitas leituras atuais é uma biografia do Joe Strummer, "Redemption Song", de Chris Salewicz. A leitura me fez voltar a ouvir Clash (fico besta ao lembrar que já era fã da banda aos 11, 12 anos _como é que uma criança é capaz de tamanho bom gosto?) e derivados (101ers, Big Audio Dynamite, Havana 3 A.M., Latino Rockabilly War, The Mescaleros, Carbon/Silicon e até Ellen Foley e The Good, The Bad & The Queen, mas nada que chegue perto do original em seu auge _ou seja, "Sandinista!") obsessivamente. Como ter trabalhado com cobertura de shows e da indústria fonográfica acabou me afastando dessa área (basicamente, o que era curtição virou trabalho e perdeu a graça) e o universo é gigantesco, mesmo com ajuda de Last.fm e quetais não sei se atualmente há alguma banda comparável em produção e em qualidade (foram oito vinis em 5 anos, sendo que apenas um punhado de faixas não eram muito boas _estou desconsiderando o "Cut the Crap", é claro), o que é muito deprimente. O mundo bem que precisava. Update: está sendo lançado outro disco ao vivo deles, com o famoso show de abertura pra o Who no Shea Stadium, em 1982. Iupi!

    Falando em livro, vai aí um trecho bem interessante do "Conversas com Woody Allen: seus Filmes, o Cinema e a Filmagem", recém-lançado pela editora onde trabalha meu ex-colega de Ilustrada Cassiano Elek Machado (a pergunta foi feita há menos de quatro anos):

    "Eric Lax - Faça uma avaliação de sua carreira até hoje.

    Woody Allen - Minha sensação objetiva é que não atingi nada significativo artisticamente. Não digo isso com tristeza, apenas descrevo o que sinto como verdade. Sinto que não dei nenhuma real contribuição ao cinema. Em comparação com contemporâneos como o Scorsese, o Coppola ou o Spielberg, realmente não influenciei ninguém de forma significativa. Quer dizer, muitos dos meus contemporâneos influenciaram jovens diretores. O Stanley Kubrick é um exemplo primordial. Eu não sou nenhum tipo de influência. Por isso é que sempre me pareceu estranho que prestassem tanta atenção em mim ao longo dos anos. Nunca tive um grande público, nunca fiz muito dinheiro, nunca tratei de temas controvertidos nem prestei atenção nenhuma na moda. Os meus filmes não estimularam a opinião do país em temas sociais, políticos ou intelectuais. São filmes modestos, feitos com orçamentos modestos, que produzem lucros extremamente modestos e não abalam de forma alguma o mundo do show business. Não tem jovens diretores correndo para me imitar e fazer filmes do jeito que eu faço. Nunca tive domínio técnico suficiente ou suficiente profundidade de idéias para fazer ninguém pensar. Sou apenas um piadista de Brooklyn/Broadway que teve muita sorte. E eu não sou uma pessoa modesta demais. Quando sou bom, sei apreciar a mim mesmo. Não sou triste, nem confessadamente masoquista a esse respeito, mas sou inteligente o bastante para saber que explorei ao máximo meus dotes limitados, ganhei um bom dinheiro em comparação com o meu pai e, o mais importante, de longe preservei minha saúde. Quando eu era menino, sempre corria para o cinema em busca de um escape - às vezes doze ou catorze filmes por semana. E, adulto, consegui viver a minha vida de forma um tanto autocomplacente. Consigo fazer os filmes que quero, e então, durante um ano, posso viver naquele mundo irreal de mulheres bonitas e homens interessantes, situações dramáticas, figurinos, cenários e realidade manipulada. Sem falar em toda a maravilhosa música e em todos os lugares aonde me levou. [Ri] Ah, e às vezes eu consigo sair com uma das atrizes. O que poderia ser melhor? Escapei para uma vida no cinema do outro lado da câmera, mais que para o lado da platéia. É irônico eu fazer filmes escapistas, mas não é o público que escapa - sou eu."

    No texto que vem: "Um Dia, um Gato" e outros filmes.

    21 comentários:

    Anônimo disse...

    Quem dá para o Richard Harris é necrófilo?

    Marcelo V. disse...

    Só se for depois que ele morreu...

    Anônimo disse...

    Eu adoro Os Incriveis do Brad Bird, acho um desenho/aventura ótimo. Sem contar as referências.

    Fiquei com a mesma sensação depois que vi American Gangster (o de faltar algo). Little Miss Sunshine erra em tudo que tenta investir, desde Road Movie até comédia 'leve'. O momento maior do filme está entre os dois como você citou, aliás, Arkin fez bem em tirar o Oscar do Eddie Murphy.

    E a "Bande à part", de acordo com Godard, é o pior filme de longe (apesar de eu achar que ele falou isso só para completar a crítica ao Tarantino).

    E por falar no Tarantino, assista ao Death Proof, um pouco superior (apesar de fugir em certos momentos do tema "Grindhouse") a Planet Terror (que também gosto).

    Você chegou a ver os últimos filmes do Allen (não sei se você comentou por aqui)? Achei Vicky Cristina Barcelona um dos melhores dele na década.

    Marcelo V. disse...

    Pips, também gostei de "Os Incríveis", mas prefiro os outros que citei. Nem lembrava que o Arkin ganhou o Oscar; o filme é muito ruim, estava esperando mais. Conheço o texto em que Godard disse isso e também acho que ele só falou tal coisa para queimar o Tarantino; coisa de velho chato. "Death Proof" já saiu direto em DVD? Não fiquei sabendo. Dizem que é mesmo melhor, mas também dizem, ao contrário do que você escreveu, que ele é mais fiel ao espírito "grindhouse" do que "Planet Terror", que é mais satírico. O Allen mais recente que vi é o "Match Point", do qual não sou grande fã. O filme recente dele mais elogiado foi o "Cassandra's Dream". Um dia tiro esse atraso.

    Saymon Nascimento disse...

    - Eu detesto Robert Rodriguez com todas as forças, mas de Planeta terror eu gostei.
    - Já viu o último Pixar, Wall_e, com seus 40 minutos sem diálogos?
    Radical, e um dos melhores do ano. É do mesmo diretor de Nemo, o melhor pixar.
    - Também não gosto dos filmes de Wes Anderson. È só direção de arte. Sensibilidade não brota do cenário, não tem jeito.
    - Cabíria > Mamma Roma, acho. Até por causa do final, da mulher que se reergue do nada em um piscar de olhos, mesmo machucada.
    - Eu amo Antonioni. Menos Deserto Vermelho.
    - Não quero ser exagerado, mas nenhum Godard vale Um Só Pecado, mesmo que Godard seja um gênio maior. Às vezes mais vale chutar a vanguarda pra longe mesmo. Se bem que mesmo formamelmente pouco inovador, Trufô continua prezando a liberdade de espírito da nouvelle vague em seus filmes acadêmicos e lindos, como Adele H e As Duas Inglesas e o Amor.
    - Trinta Anos Esta Noite, maravilha. Bom ver a particpação precisa de Jeanne Moreau.
    - Também gosto muito de A Faca Na Água. É cool, na falta de palavra melhor.
    - Cavalos de Fogo é um filme lindíssimo, alien. Força soviética herdeira do Terra, folclórico/melodramático.

    Marcelo V. disse...

    Saymon, também achei "Planeta Terror" o melhor do Rodríguez, diretor de quem não sou fã, mas admiro o espírito independente e empreendedor.
    Ainda não vi "Wall-E", que está sendo considerado o melhor do ano pela Liga dos Blogs Cinematográficos.
    Do Anderson, gosto de "Rushmore" e "...Zissou" (não vi o "Darjeeling"). Muito longe de ser a abominação que é "Little Miss Sunshine".
    "Cabíria" é um filme bem mais fácil de gostar, sem dúvida.
    O único Antonioni que amei até o momento foi "Blow-Up".
    Não tenho problema algum com a forma narrativa (ou não-narrativa) adotada em um filme. Achei interessante esta virada do Truffaut, depois de "Jules et Jim", um filme que me pareceu bastante mal resolvido. Mas prefiro esses do Godard.
    Não sabia o título brasileiro do filme do Parajanov, muito bonito.

    Pips disse...

    Na verdade, se eu der as explicações sobre o porquê dele não seguir o estilo grindhouse, vou acabar estragando a graça de vê-lo pela primeira vez. O filme não saiu em DVD, a Europa Filmes adiou a data de lançamento no cinema, da última vez, para outubro. Ou seja, sabe-se lá quando chega por aqui.

    Wall*E é um dos melhores Pixar mesmo, mas ainda não sei se bate Toy Story (e vem o terceiro por aí), mas com certeza fica entre os três melhores do ano.

    E "Zissou" é obra-prima do Anderson, "Darjeeling" diverte mas não supera, fica na média dele. O clímax não é tão intenso quanto Zissou, o que é um pecado, afinal ele prepara isso o filme todo.

    Marcelo V. disse...

    Pips, só vi o primeiro "Toy Story". Achei um grande filme, independentemente do avanço tecnológico que representou.

    Estou de plantão no jornal e uma das TVs está sintonizada (sem som, pois ninguém é de ferro) na Globo, onde passa o "Zorra Total". É uma esquete com o Nerso da Capitinga (que reconheço da "Escolinha do Professor Raimundo") com uma jovem loira gostosa cujo nome desconheço que fica nua atrás de uma cerca. Como perguntar não ofende, vá lá: a pessoa que criou esta imagem por um acaso se inspirou no filme do Parajanov?

    Saymon Nascimento disse...

    Eu já vi um quadro do Zorra Total, "Severino", inspirado em Sweet Charity, de Bob Fosse. Severino (Paulo Silvino) é chamado para ocupar o lugar da barra na cena do Hey Big Spender.

    Nunca se sabe. Ano passado vi que Roberto Farias tava dirigindo Sob Nova Direção, depois do Fantástico.

    Anônimo disse...

    Nãoa credito que você falou mal de A DANÇA DOS VAMPIROS !!!

    Ailton Monteiro disse...

    Marcelo, será que não rola de vc converter o filme para divx e colocá-lo no rapidshare, divulgando o link aqui pra gente poder baixar o curta e fazer uma apreciação?

    Ailton Monteiro disse...

    Achei o final de PEQUENA MISS SUNSHINE descaradamente chupado de UM GRANDE GAROTO. Mas o filme é bem simpático, Marcelo. E olha que eu não sou dos fãs dele não.

    Ailton Monteiro disse...

    Como não admirar ainda mais um cara como Woody Allen, depois desse exemplo de modéstia?? É o oposto do Mojica, que ficava todo vaidoso quando o chamavam de gênio. heheheh.. Acho que Orson Welles era assim também. heheh

    Ailton Monteiro disse...

    Ah, e eu também não curti muito A DANÇA DOS VAMPIROS. E desculpa aí ter mandando posts em prestação, mas é que o formato do teu texto acaba levando a isso. hehehe

    Marcelo V. disse...

    Saymon, eu adoro o Paulo Silvino, mas não é ele que vai me fazer ver "Zorra Total".

    Leandro, mesmo com os decotes de Shaton Tate e Fiona Lewis, a beleza da fotografia e da direção de arte e a trilha do Komeda, acho o enredo fraco e sem graça.

    Ailton, você está falando de "A Volta do Regresso"? Além de não saber fazer o que você sugeriu, não é mais legal disponibilizar direto o DVD, com extras e tudo?

    E eu lembro de ter achado "Um Grande Garoto" bem agradável (embora eu pense que o livro seja uma droga), portanto não consigo relacioná-lo com essa porcaria de Dayton/Faris.

    Pips disse...

    Quando estiver disponível avise. Eu nem conheço esse KaraGarga.

    E mais do que nunca concordo com o LFV.

    Ailton Monteiro disse...

    Sim, falo de A VOLTA DO REGRESSO. Também não sei como transformar dvd em divx, mas deve ser difícil. E a vantagem é o tamanho do arquivo, que fica mais fácil de baixar e compartilhar. E dá pra fazer o mesmo com os extras.

    A semelhança com O GRANDE GAROTO (do qual também não gostei do livro, só do filme) é o final, com a apresentação e o apoio.

    Marcelo V. disse...

    Pips, KaraGarga é uma comunidade de compartilhamento de filmes mais raros (e também música e livros). Eu recomendo.

    Ailton, o arquivo da "Volta" não ficou grande, não chegou a 1 giga.

    Anônimo disse...

    Marcelão

    O Dan Caetano escreveu sobre Nas Duas Almas no blog dele, mas tem que voltar.

    passarim.zip.net

    Sobre o livro do Joe Strummer, quero ficar na fila, pode?

    Anônimo disse...

    Cara


    Sinto muito ser relapso, mas só agora vi seu pequeno coment sobre a noite do comodoro. Amei ler o texto!
    Obrigado mais uma vez!

    Marcelo V. disse...

    Legal, Vebis, vou dar o link no próximo texto.

    Na platéia