A gruta é mais extensa do que a gruta

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    quinta-feira, maio 22, 2008

    Façam um favor a si mesmos e pulem o desabafo que segue (melhor ainda, o texto todo): normalmente, quando vou a um festival ou mostra de curtas (especialmente os brasileiros), acabo mezzo deprimido mezzo revoltado. O nível invariavelmente costuma ser muito baixo, mas as coisas parecem piorar a cada ano. Antigamente, os problemas técnicos (causados em sua maioria pelo baixo orçamento ou pela inexperiência da equipe _que também afetam "A Volta do Regresso") saltavam à vista. Hoje, está cheio de filmes "bem-feitos" (alguns, inclusive, de amigos meus) por aí que são lamentáveis. Por um lado, alguns caem na esparrela de que "o roteiro é supervalorizado" (e aí dá no que dá), enquanto outros se limitam a fazer a novelinha mais safada, toscas tentativas de chantagem emocional para semi-analfabetos _desgraçadamente, ambos os tipos de filmes costumam se dar bem em festivais e com a crítica mais despreparada ou preguiçosa, que insistem em ver "sensibilidade" nessa choradeira toda ou "audácia" nessa regurgitação mal-ajambrada de velhas idéias. Estou simplesmente de saco cheio desse cineminha pouco ambicioso, careta, covarde e bunda-mole. E o pior é que é gente jovem que está cometendo essas aberrações (não sejamos ingênuos: eles querem é grana). Êta geraçãozinha conformada e feliz. Como bem resumiu um personagem de "Senta no Meu, que Eu Entro na Sua", do recém-homenageado Ody Fraga: "Puta que pariu! Estamos fodidos!".

    Sintomático de parte dessa cena horrenda é essa modinha altamente em voga entre os pretensos cineastas de hoje: se os anos 1960 incluiu o que se convencionou chamar de Cinema Novo, os anos 2000 vão acabar marcados como a década que implementou o Cinema Geriátrico (ou Cinema Alzheimer, Cinema Reumatismo, Cinema Osteoporose, não sei qual rótulo vai emplacar). Eu vou acabar dando um tiro nos tímpanos (mas não sei de quem) na próxima vez em que eu vir um filme de velhinho deprimido feito por alguém com 20 e poucos anos! Se eu fosse oportunista, entraria nessa onda lucrativa de fazer festivais mequetrefes com temas politicamente corretos e lançava o "Festival da Melhor Idade". O tema da edição de estréia poderia ser "Incontinência Urinária", com patrocínio da Johnson & Johnson.

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    Recebi um e-mail muito simpático da Cibele Amaral, cujo filme "Enciclopédia do Inusitado e do Irracional" deu o merecido prêmio de melhor ator a Wolney de Assis no 40º Festival de Brasília. Ela escreveu do Recife, onde rolou o Cine-PE, e contou que os curtas estão chatíssimos. Não me surpreende.

    Quem também me escreve é Carlo Mossy, que já passou dos 60 anos, mas está com um projeto muito mais tesudo do que essa molecada mórbida, que nem leu Proust (e talvez nem tenha visto os filmes recentes do Stallone). O título? "Relações MUITO Perversas".

    Ênio Gonçalves, que está em um vídeo bem legal chamado "O Micarias" (um dos raros que vão na contramão da tendência de "filme com velhinho doente e deprimido" _este, sim, poderia ser chamado de "um retrato sensível da terceira idade"), também manda um alô. Mal posso esperar para vê-lo no próximo filme do Carlão.

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    "A Volta do Regresso" vai fazer sua estréia no Rio. Vai passar no Cinesul, mas não na mostra competitiva. Por um lado é bom, porque eu tenho ojeriza a competições desde sempre e não acho que filmes (ou qualquer obra de arte) sejam cavalos de corrida. Por outro, é revoltante (embora esperado) que filmes que eu já vi e que são muito piores (ingênuos e caretas _premiados, entretanto) tenham sido priorizados. A mostra rola daqui a um mês, até lá informo data e local. Mossy não vai perder por nada deste mundo, e Gustavo Engracia, que estará em Belo Horizonte filmando com Luiz Villaça, também falou que vai. Eu farei um esforço.

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    "There's too many of them. I can't kill the world", diz a Deus um brilhante Robert Mitchum, falso moralista em uma "casa de burlesco". Imperfeito, vivo e único, como o filme de Charles Laughton. Datado, porém fundamentado em arquétipos que fazem dele um clássico. A história, em alta velocidade, segue por caminhos nunca óbvios, e toda a ambientação e as interpretações fogem do naturalismo como o diabo da cruz. Falas fantásticas, canções poderosíssimas. Preciso revê-lo para falar mais a respeito, mas posso dizer sem medo de errar (embora entenda que muitos possam estranhar, o que não tem importância alguma) que achei bastante parecido com "A Volta do Regresso". Outra pérola finalmente vista é "Mr. Arkadin", na "comprehensive version" da Criterion: complexo, lotado de personagens interessantes, com um ritmo alucinante e muito senso de humor. As imagens do início são soberbas: uma mulher nua numa praia (a deliciosa Patricia Medina) e um avião voando sem ninguém dão todo sentido a uma narrativa que passa até por uma desesperada busca por um prato de foie gras. A atuação de Orson Welles, como uma personagem "larger than life" e mefistotélica (a cara dele, afinal?), é o óbvio destaque, mas também temos momentos preciosos de Katina Paxinou, Akim Tamiroff e Tamara Shayne.

    Também me impressionou bastante "Kiss Me Deadly", cinema de altíssimo impacto, repleto de personagens secundários muito fortes (como o grego Nick, interpretado pelo grego Nick Dennis, além de um monte de mulheres interessantes: Cloris Leachman, Marian Carr, Gaby Rodgers _pena que não acharam uma Velda mais bonita, Maxine Cooper não está à sua altura). O final, recuperado, é incrível. Outro destaque é "Bad Day at Black Rock", um western comtemporâneo, curto e certeiro. Ambientado no meio do nada e estrelado por um durão Spencer Tracy (Robert Ryan, Lee Marvin e Ernest Borgnine estão entre os vilões _Walter Brennan está quase irreconhecível) é também uma pérola do suspense, desenrolando o novelo dos acontecimentos com sutileza e excelente ritmo. O CinemaScope faz com que planos fechados sejam praticamente abandonados, o que nos distancia das personagens, desinflando o filme _que, mesmo assim, não fica "pequeno". E outro filme de impacto, embora longe de ser tão bom quanto estes, é "The Phenix City Story", de Phil Karlson. Cheio de imperfeições e problemas (com pelo menos um momento digno de filme trash _mas há uma fantástica caricatura de "Gilda"), ainda assim é marcante: apesar de moral, é violentíssimo (a ponto de ser quase insuportável _uma sucessão revoltante de morte, destruição e impunidade) e corretamente pessimista. Infelizmente, não perdeu um pingo da atualidade, pois o que retrata é exatamente o que vivemos hoje, bem aqui no Brasil e, provavelmente, em todos os lugares habitados por humanos: uma sociedade dominada pelo crime e pela brutalidade. Não consigo me lembrar de nenhum filme de terror que seja tão assustador quanto este aqui. A não ser que vocês considerem "Nuit e Brouillard" um filme de terror: a lembrança de toda aquela mortandade é terrível e sempre necessária. Finalizando este bloco meio noir, só falta citar o invulgar e violento "The Big Combo", do grande Joseph H. Lewis, que me fez lembrar da máxima de Hitchcock de que "quanto melhor é o vilão, melhor é o filme": o Mr. Brown de Richard Conte é absolutamente fantástico e protagoniza cenas bastante originais (curiosamente ligadas à audição). Jean Wallace está lindíssima, parece saída de uma HQ de "Spirit" _e ainda temos Lee Van Cleef num papel curioso, o de capanga gay.

    Finalmente coloquei meus olhos diante de "Le Salaire de la Peur", que alguns dizem ser "o melhor filme francês de todos os tempos". Muito longe disso; mesmo assim, não deixa de ser interessante, pela variedade: o início é maravilhoso, apresentando um logradouro na América Latina e seus desocupados habitantes, entre eles Yves Montand (mas com destaque absoluto para a brasileira casada com o diretor, Véra Clouzot, que era filha do Gilberto Amado). Depois da crítica ao capitalismo, ao fim de sua primeira hora, se torna mais convencional e bastante tenso. Curioso que dois personagens se chamam Mario e Luigi, sendo que o Luigi é a cara do Super Mario! Outro clássico que gerou mais admiração do que entusiasmo (talvez porque tenha sido muito imitado) é "Os Sete Samurais" (prefiro "Os 47 Ronin" _não vou nem citar os do Kobayashi, que é covardia). Poderia ser mais curto e menos dispersivo, mas claro que é muito melhor do que o remake do John Sturges. Takashi Shimura volta a segurar bem as pontas como protagonista de um filme de Kurosawa (embora ele esteja bem melhor em "Viver" _um filme também superior), e Toshirô Mifune entra com o contraponto cômico. É interessante como é bastante didático em relação a estratégia militar, mas ao mesmo tempo conclui de modo antibélico _o que é o mínimo que se espera de qualquer filme de guerra.

    Voltei também a "On the Waterfront", que eu tinha visto na Globo, quando criança (e gostado mais). História de redenção claramente de inspiração católica, de um moralismo não-disfarçado, com diálogos muito bons, embora didáticos, que deu a Marlon Brando um de seus papéis mais famosos (John Garfield, Montgomery Clift, Frank Sinatra e até Paul Newman foram considerados). Estréia no cinema de Eva Marie Saint, que há anos trabalhava na TV _o papel tinha sido oferecido antes a Grace Kelly, que felizmente preferiu fazer "Janela Indiscreta", e a Elizabeth Montgomery, que ficaria famosa como "A Feiticeira". Lee J. Cobb e Karl Malden, ótimos, como de costume _a dupla Kazan e Malden voltaria em "Baby Doll", adaptação de duas peças curtas de Tennessee Williams que marca a estréia de Eli Wallach no cinema; mas este é inferior e muito limitado às convenções teatrais, e, embora Carroll Baker esteja bem, o diretor marcou bobeira em não seguir o conselho do dramaturgo e escalar Marilyn Monroe, que hoje conferiria ao filme muito mais interesse. Também moral, sobre o labo bom e o ruim das corporações capitalistas, é "Executive Suite", sustentado pela direção elegante de Robert Wise (embora alguns cortes sejam muito estranhos, e alguns movimentos de câmera, desnecessários) e por um elenco fantástico (Henry Fonda recusou o papel principal), tendo William Holden e Fredric March entre os homens e Barbara Stanwyck e Shelley Winters entre as mulheres (e muitos outros coadjuvantes de renome). A falta de música funciona. E "Crime Wave", de Andre de Toth, pequeno e ótimo policial de baixo orçamento, filmado em menos de duas semanas, em Los Angeles (com muito uso de locações nas externas), e lançado dois anos após ter ficado pronto. Estrelam Sterling Hayden, Gene Nelson (mais conhecido como ator em musicais; também era diretor) e Charles Bronson em um papel pequeno _mas já com falas. O roteiro é muito bom.

    Um filme único que, contra todas as previsões, se destaca no período é "Salt of the Earth", que, em resumo, eu chamaria de "um dos filmes preferidos de Ken Loach" ou algo que o valha _e não apenas porque retrata uma greve. Dirigido por um dos célebres "Dez de Hollywood", Herbert Biberman (que foi preso), e proibido por 11 anos nos EUA (é o único filme americano a entrar na lista negra), foi feito, contra tudo e contra todos (o negativo inclusive teve de ser revelado escondido), com muito sacrifício (como a história, real, que relata) e com dinheiro do sindicato dos mineiros, além de contar com a participação dos mesmos como atores e figurantes (os atores profissionais são poucos, entre eles Rosaura Revueltas _que foi deportada, por causa deste trabalho, como imigrante ilegal, embora seus papéis estivessem em ordem, e nunca mais trabalhou nos EUA_ e Will Geer). Um aspecto bem interessante é a questão sexual colocada no filme: seja de esquerda, de direita ou de centro, o machismo sempre encontra seu espaço.

    Depois de muitos anos, revejo "Artists and Models" e me deparo com um filme extremamente diversificado (e bom em quase tudo a que se propõe): vai de musical, comédia, romance e surpreendentemente desemboca na paranóia da Guerra Fria (não deixa de ser um belo documento de sua época _sobra até para a condenação das histórias em quadrinhos como estimulantes da delinqüência juvenil). Lewis já era um comediante maduro, em pleno domínio de seu corpo e voz. Há uma cena que satiriza "Janela Indiscreta"! Mais fantasioso é "It's Always Fair Weather", o terceiro filme de Stanley Donen e Gene Kelly. Não é tão bom quanto seu antecessor, "Cantando na Chuva", mas não deixa de ser ótimo (apesar de, a princípio, parecer uma bela bobagem), não apenas pela boa história, mas principalmente pela inventividade visual _em especial nos planos em que a tela é dividida em três e nos mostra a passagem dos anos dos três protagonistas ou quando eles, em espaços diferentes, realizam a mesma coreografia e cantam juntos. Como musical em si, não é memorável _quem acaba se destacando é Dolores Gray, que não fez muito cinema. E embora Kelly e outro gênio do musical, Cyd Charisse, não sejam tão bem aproveitados, eles não deixam de brilhar _como é de esperar. Voltando a Tashlin, "The Girl Can't help It", um dos filmes preferidos dos Beatles, está longe de ser seu trabalho mais inspirado (embora traga algumas gags fantásticas, como as das garrafas de leite); mas, como outros do diretor/produtor/roteirista, é exemplarmente contemporâneo ao registrar a mania do rock'n'roll. Jayne Mansfield (que, como no filme, teve 5 filhos _ em três casamentos, antes de morrer jovem, num acidente de carro; ela também falava 5 línguas e tocava piano e violino) está bem melhor (e menos vulgar) do que eu poderia imaginar, e Edmond O'Brien, para variar, arrebenta. Claro que o destaque são as cenas musicais, especialmente as com Little Richard, Eddie Cochran e Julie London (mas Mansfield também não faz feio cantando, embora ela nunca tenha deixado de ser uma sub-Marilyn).

    E como o período é pródigo em westerns, vi uma cacetada deles, tanto que só vou citar os destaques: em "The Far Country", Anthony Mann vai para o norte gelado e abusa dos planos gerais, enquanto James Stewart interpreta o herói antipático e relutante, John McIntire rouba a cena como o vilão (sempre a personagem mais interessante, nos filmes de Mann) e Walter Brennan curiosamente passa em branco (sem trocadilho). "The Indian Fighter", também dirigido por De Toth, é uma produção caprichada de Kirk Douglas, filmada em CinemaScope em belas locações no Oregon, que segue a tendência de não relegar os índios ao papel de cadáveres a cavalo. Walther Matthau e Elsa Martinelli, ambos em início de carreira no cinema, são respectivamente o vilão-ambicioso-e-zé-mané-que-causa-encrenca e a típica índia-gostosíssima-que-não-tem-cara-de-índia; Lon Chaney Jr., Elisha Cook Jr. e Hank Worden também marcam presença. E o scope também brilhantemente usado por Delmer Daves em "The Last Wagon", repleto de planos abertos belíssimos (lembram pinturas luministas), e os movimentos de câmera são pertinentes e elegantes (só implico mesmo com as noites americanas). Richard Widmark (que está a cara do Klaus Kinski) não apenas estrela, como carrega o filme nas costas, que passa voando, longe de clichês. Outro destaque é Stephanie Griffin, lindíssima.

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    Deixar os anos 1950 para trás (como isto aqui está grande demais, estou deixando de citar filmes de George Sidney, Howard Hawks, George Cukor, Fritz Lang, Nicholas Ray e Michelangelo Antonioni) e vir para a atualidade é como ir do guaraná para o suor de um lutador de sumô: os únicos filmes recentes que vi foram os três "Piratas do Caribe", já que a caixa de DVDs apareceu em casa. No geral, é uma grande bobagem, o que não significa necessariamente uma coisa ruim. O segredo está no senso de humor, basicamente concentrado em Johnny Depp (no geral, o elenco é bom); a apresentação de sua personagem no primeiro filme é brilhante _mas, também, copiando Buster Keaton, é difícil não sair algo minimamente bom. Muitos trechos, especialmente dos dois primeiros filmes, me lembram dos Trapalhões da safra J. B. Tanko (e isto é um tremendo elogio). A atuação de Geoffrey Rush no primeiro filme talvez seja a melhor de sua carreira (pelo menos, até onde eu vi). O segundo filme, em especial, ganha muito com o nonsense: é justamente nos momentos de mais palhaçada que o filme fica interessante, a destacar as cenas da jaula de ossos, a da roda do moinho e a de Jack Sparrow fugindo dos canibais amarrado a um pau _em suma, quanto mais ridículo, melhor. Outro destaque novamente vai para o vilão: Bill Nighy está excelente como Davy Jones, cuja animação por computador é impressionante (as cenas com o kraken também funcionam); outra adição interessantíssima é Naomie Harris, como Tia Dalma. O terceiro filme é de longe o pior, o que não surpreende: após a palhaçada, algo mais "sério" e sombrio teria de vir, com a morte de vários personagens e a mais do que manjada guerra (com direito a discurso e tudo). É o mais confuso dos três filmes, o que menos dá vontade de seguir a história _como se não bastasse, é o mais longo. E o final é razoavelmente previsível, com uma exceção. O grande ponto alto (já que a participação de Keith Richards, embora não seja ruim, não é excepcional) é mesmo a criação de planos visualmente bastante complexos, do ponto de vista da computação gráfica. Em resumo, é a recuperação de um gênero rico e que deu uma boa sumida e claramente um projeto infantil (não à toda traz a marca da Disney), que deve funcionar muito bem para meninos de 8 a 10 anos.

    Séries: por causa de uma caixa de DVDs picareta, tive de iniciar a segunda de "Prison Break" sem ter visto os oito últimos episódios da primeira (ou seja, não sei exatamente como eles escaparam); também demorou um bom tempo até eu me lembrar de várias personagens que não haviam sido tão marcantes. Tirando estes problemas, o show é bom no que se propõe: ação e tensão quase ininterrupta, com ganchos espalhados praticamente por qualquer pausa para os comerciais. Um belo elenco, personagens cativantes (minhas preferidas são o T-Bag de Robert Knepper, o Mahone de William Fichtner, o Patoshik de Silas Weir Mitchell e o Paul Kellerman de Paul Adelstein) e não muito maniqueístas e uma história que não tem muito peso garantem a viagem. E depois de muitos anos voltei às sitcoms, revendo a primeira temporada de "That 70's Show" (difícil acreditar que já se passaram dez anos). Dada a distância no tempo, tinha tudo para parecer uma bobagem, mas é muito acima da média _praticamente todas as personagens são perfeitas, porque arquetípicas; mas faz falta o Leo de Tommy Chong (embora as divertidíssimas cenas de roda de fumo estejam lá desde o começo _só demora um pouco para o Red Forman de Kurtwood Smith começar a chamar o Eric de Topher Grace de "dumb ass"). Também é impressionante como ela lançou vários jovens atores hoje famosos _e a deliciosa Laura Prepon, por quem eu tinha a maior tara há dez anos (mas, também, o meu fraco por ruivas é notório).

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    "O verdadeiro perdedor é aquele que, na última hora, olhando para trás, vai ter a impressão de que desperdiçou a sua corrida. O que ele acumulou, tudo isso me parece bastante acessório. Para mim, o perdedor é aquele que não conseguiu viver sua vida com toda a intensidade que ela merece. O que não tem nada a ver com felicidade. O projeto de sermos felizes é profundamente errado, concebido para nos manter na insatisfação, o que é absolutamente necessário na sociedade de consumo. O ganhador é quem teve uma alta qualidade de experiência, seja qual for, que tenha sido intensamente. A felicidade, eu sou contra. Sexo não é felicidade, é alegria."

    Uma das coisas que eu menos gostava de fazer, quando trabalhava na Ilustrada, era editar os textos do Contardo Calligaris (preferia os do Marcelo Coelho, os únicos que vinham sem título _e eu sempre colocava os de maior impacto possível_, e os do Cony _que, infelizmente, tinha os palavrões censurados). Nada contra os textos em si, o problema era o excesso de erros _compreensíveis, já que se trata de um estrangeiro. Eram tantos (dezenas) que eu trapaceava e levava para a consultora de português, Thaís Nicoleti de Camargo (a quem eu assitia no "Vestibulando", quando estava naquela parte chata da vida), corrigir para mim. Mas este trecho de uma entrevista dele corrobora o que penso há muito tempo; é a minha atitude diante da vida.

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    Last, but not least ou "fechando com chave de ouro": estava devendo aqui uma pequena homenagem a Plácido de Campos Junior. Além de me incentivar muito a filmar um outro roteiro que escrevi, chamado "Gato Preto" (do qual ele gostava mais do que eu), foi ele quem fez a melhor crítica de "A Volta do Regresso", resumindo o filme a uma palavra que, também na minha opinião, lhe cai como uma luva: "humano". Ele faz uma pequena participação (na verdade, é a primeira pessoa que aparece), declamando um trecho de "Hamlet", usando uma coroa de papel e um manto feito com um saco de café (abaixo, uma foto de "making of"). Ficam registrados aqui minha gratidão, meu carinho e minha admiração por ele, além da honra de tê-lo para sempre em meu pequeno filme.


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